terça-feira, 1 de maio de 2012

       No dia 20 de Fevereiro de 2012 caminhava pelo centro comercial São Tiago, que existe na cidade de Castelo Branco. Este era o centro comercial de referência nessa cidade (onde vivi toda a minha infância e adolescência) quando tinha 16 anos. Foi nesse espaço que, na altura, descobrimos (eu e a minha geração) pontos de ocupação temporários e fomos construindo a nossa identidade nos ícones que partilhávamos e que se expunham lá (bandas internacionais; bandas locais; bandas de garagem; lojas de sreet-wear; lojas de música especializada). Tornávamos essas deambulações nossas e transportávamos os ícones connosco para outros espaços (os concertos nos bares ou no barracão do tio do vocalista, as sessões de cinema alternativo na sala de cinema do São Tiago, às quartas ao final da tarde, onde estava eu e mais quatro, no máximo). 
       Uma década depois volto àquele lugar. As lojas estavam agora fechadas, vazias, cartas acumuladas do lado de dentro da porta que conseguia contar através da montra despida, uma luz suja produzida pela luz natural que conseguia penetrar naquele local, com os neons desligados, sem cor. Na montra da antiga loja de música especializada, encontro alguns cartazes com a cor desbotada, de entre os quais distingo um em que figura a estrela de grunge: Kurt Cobain. 
       Neste gesto em forma de passeio, o abandono em que aquele centro comercial caiu, permitiu-me ocupá-lo e os fantasmas da minha vida passada, começaram a manifestar-se. No fundo do corredor ouvia-se o som de uma guitarra eléctrica tocada por um aprendiz, que repetia dois acordes e o mesmo ritmo durante algum tempo (o aluno devia ter à volta de 16 anos no máximo). Aquela era a música do treino mas também de um êxtase descarregado num amplificador de baixa potência. O professor (aparentava ter à volta de 30 anos) junta-se a ele numa das poucas lojas ocupadas do shopping e acompanha-o na bateria. O aluno mantém-se monorrítmico, monocórdico, com o professor ao seu lado. Fico a olhá-los de longe durante algum tempo e decido abandonar aquele lugar e regressar à rua. Enquanto me afasto, o professor vai aumentando o ritmo na bateria e o aluno tenta apanhá-lo. 

 Nuno Leão

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